As fortes chuvas que
caíram no Vale do São Francisco em janeiro deste ano animaram as/os
ribeirinhos. O Lago de Sobradinho, que no mês de novembro de 2015 quase chegou
ao seu volume morto, agora já ultrapassa 26% do seu volume útil, segundo
Boletim da ANA – Agência Nacional de Águas. Isso se deve à elevada vazão de
afluência de 5,5 mil m3/s, 14% superior à média histórica do período 1931-2014
e 295% superior à média dos últimos dois anos para o mês de fevereiro.
Porém, é preciso
atentar que este dado não representa segurança no tocante aos diversos usos da
água do São Francisco, se considerar que a vazão de defluência do lago é
regulada conforme os interesses dos grandes empreendedores, de modo que em
meados de 2014 o volume do lago foi reduzido num ritmo de 6% ao mês e em 2015
em 1,5% ao mês, chegando ao final do ano com menos de 2% do volume útil. Isto
significa que ao final deste ano o cenário do ano anterior pode se repetir.
Esta preocupação parte
da análise de que a recuperação do volume do lago, período em que a afluência
supera a defluência, ocorre apenas em cerca de quatro meses por ano e têm sido
raros os anos em que se ultrapassou os 60% do volume útil. Desse modo é
provável que a recarga esteja reduzida a partir de março, ao passo que a
defluência continua significativa, podendo ocorrer nova crise a depender do
regime de chuva do próximo ano.
É importante destacar
que em situação de crise os setores com menor poder econômico sofrem mais
diretamente. André Rocha, coordenador do Eixo Clima e Água do Irpaa, lembra que
em outubro e novembro de 2015 o abastecimento humano de algumas cidades da borda
do lago ficou comprometido, no entanto os grandes perímetros irrigados
continuaram usando a água regularmente, contrariando a Lei 9.433/97 que
estabelece priorizar o abastecimento humano e a dessedentação animal em
momentos de escassez.
Causas
As secas, fenômenos
naturais e previsíveis, não são as maiores responsáveis pela crise hídrica
fortemente percebida no ano passado, segundo afirmam diversas organizações que
assinaram carta política durante a “Semana da Água” em 2015. A diminuição da
disponibilidade hídrica em algumas regiões do país conta com diversas outras
causas, dentre elas a elevada supressão vegetal de alguns biomas como a
Amazônia brasileira, o Cerrado e a Caatinga que já contam com, respectivamente,
18%, 50% e 48% desmatados. Soma-se a isso o uso descontrolado da água no
Brasil, pela indústria (média de 22%) e pelo agronegócio (média de 72%).
A vazão de consumo dos
diferentes usos consultivos na Bacia do Rio São Francisco, seguindo a ANA, é da
ordem 216 m3/s, com uma demanda que cresce mais de 5% ao ano. No Submédio São
Francisco a grande irrigação chega a consumir 95,2% de toda água retirada do
rio, conforme mostra o quadro abaixo, além de causar graves contaminações por
agrotóxicos que se soma aos esgotos sem tratamento lançados na calha do rio nas
cidades ribeirinhas, comprometendo a qualidade da água e o equilíbrio dos
organismos aquáticos.
Proposições
Ainda que os
reservatórios aumentem seus volumes não significa que a crise hídrica está
encerrada, até porque milhares de famílias que não têm acesso à água de rios,
nem dispõe da requerida estrutura para captação de água de chuva, ainda
mendigam na dependência dos carros pipas que todo ano entram em cena no fim da
época chuvosa.
Há um apelo de diversas
organizações da sociedade civil que vem debatendo as causas da crise hídrica,
dentre elas o Irpaa, no sentido de apontar para urgência de fazer valer os
mecanismos legais de contenção do desmatamento e da poluição dos mananciais, a
implementação de políticas públicas que levem ao uso sustentável e eficiente
dos recursos hídricos, por meio da revisão do modelo de outorgas e fiscalização
dos usuários. “Queremos garantia de acesso à água em quantidade e qualidade,
compatível com a realidade climática e com a cultura local, bem como uma gestão
adequada das diversas fontes de água de uso comum”, manifesta André.
Faz-se necessário que a
população continue cobrando a revitalização do Rio São Francisco que está
deixada de lado, decretando inclusive a moratória do mesmo, um dos pontos
defendidos pela Articulação Popular São Francisco Vivo como parte essencial da
revitalização. O documento da Semana da Água, deve ser retomado este ano,
defendendo inclusive a elaboração dos Planos Municipais de Água de modo a
dispor de mecanismos físicos e financeiros que permitam uma adequada
estruturação, orientação, monitoramento e controle sobre o uso da água no
Semiárido em seu contexto climático, com base na Política Nacional de Recursos
Hídricos – Lei No 9.433/1997.
Comunicação Irpaa
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